Centenas de milhões de utilizadores, divertida e fácil de utilizar. A China chegou lá e os Estados Unidos fizeram dislike.
Foi lançada em Setembro de 2016, na China, mas deve à quarentena parte importante do seu sucesso planetário. O TikTok é a rede social do momento e o mais recente alvo de Trump na guerra comercial que opõe Washington a Pequim.
Lo-Ruama Rocha rendeu-se às possibilidades oferecidas pela plataforma. Utiliza a rede chinesa por lazer.
“O que mais gosto é a criatividade nas dobragens e as encenações sobre o dia-a-dia”, refere.
Lo deixou-se cativar pela simplicidade de criar, editar e publicar um vídeo, sem necessidade de recurso a outras aplicações. Pela mesma razão, Augusto Duarte também é fã.
“A forma como o TikTok funciona torna muito mais fácil uma pessoa que não é famosa ter um grande alcance”, explica.
Um dos grandes diferenciais do serviço, propriedade da ByteDance, resulta da sua própria arquitectura, virada para a viralização. Em potência, qualquer um pode ser influencer. A distribuição foge à lógica de outras redes, sem a lista de amigos enquanto condição principal de apresentação de conteúdos.
Outra característica fundamental são os challenges (desafios), criados por outros utilizadores e aos quais é possível aderir.
A cantora Jenifer Solidade também lá está. Gosta da ‘boa onda’.
“A diferença do TikTok é que é mais divertida, muito mais descontraída”, conta.
Não ficaremos longe da verdade se dissermos que o TikTok é popular porque é fácil. É também essa a opinião de João Gata, podcaster e blogger, autor do Xá das 5.
“O imediatismo, o trabalho já estar feito. Isto é industrial, há que nunca esquecer isto. De vez em quando há uma pessoa que consegue furar o esquema e ser viral, mas acima de tudo temos as empresas que gastam um bom dinheiro para conseguir uns virais. É fácil e é barato, por enquanto”, resume.
Novo capítulo na guerra comercial
Mas como é que o TikTok se tornou protagonista do mais novo capítulo da crise Estados Unidos – China?
A resposta está resumida nesta frase do New York Times: “a primeira história de sucesso verdadeiramente global da internet chinesa”. O TikTok é um game changer, dando à Chinauma posição queaté agora pertencia em exclusivo aos criativos de Silicon Valley e geografias vizinhas – quando muitos aplicativos norte-americanos continuam bloqueados em território chinês.
“Do hardware ao software era um passinho”, resume João Gata.
Na última sexta-feira, Donald Trump assinou uma ordem executiva, dando 45 dias a uma empresa norte-americana (talvez a Microsoft) para comprar as operações do TikTok em território nacional. O decreto presidencial abrange outra app chinesa, WeChat, esta de instant messanging, da gigante Tencent. O inquilino da Casa Branca considera-as uma ameaça à segurança nacional, pelo potencial de acesso chinês a dados pessoais dos utilizadores.
“Trump quer que nos EUA tudo o que sejam conteúdos TikTok não estejam controlados pelos chineses, mas haja um franchising americano”, explica Germano Almeida, especialista em política norte-americana.
Em Junho, a rede social chinesa saltou para as manchetes da imprensa internacional, depois de um challenge ter conseguido baralhar as contas do republicano, ao esgotar um pavilhão com 19 mil lugares que, afinal, ficou praticamente vazio durante um comício de campanha. Mas o problema será mesmo dados e a disputa com a China.
“Se és um activista em Hong Kong, um militar americano no Afeganistão e publicas uma brincadeira no TikTok, se calhar, já é de se preocupar a forma como o governo chinês possa vir a ter acesso aos teus dados”, acrescenta.
O podcaster João Gata contrapõe. “Os nossos dados já estão por aí”, relembra.
“Os dados são o que menos me preocupa, porque já os oferecemos há 10 ou 15 anos, quando abrimos a primeira conta Gmail, ou assinámos o Facebook”.
Números da Sensor Tower indicam que, só na Play Store, o TikTok já foi baixado mais de 2 mil milhões de vezes, contando com 800 milhões de utilizadores activos. 41% dos utilizadores têm entre 16 e 24 anos.
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Quadro legal de protecção de dados “carece de actualização” – CNPD
Em Cabo Verde, a protecção de dados pessoais é regulada pela Comissão Nacional de Protecção de Dados (CNPD). O seu presidente, Faustino Varela, considera necessária a criação de mecanismos legais específicos para as redes sociais.
A instituição opera a partir de um quadro legal, baseado na própria Constituição (que garante o direito à privacidade) e num regime jurídico geral, de 2013. O Código Penal e a chamada Lei de Cibercrime prevêem crimes que possam comprometer a privacidade e a protecção de dados digitais. Pela natureza transfronteiriça de circulação e tratamento de dados, Cabo Verde faz parte dos principais instrumentos internacionais aplicáveis.
Faustino Varela entende ser desejável a actualização do regime jurídico.
“Em relação à regulação dos serviços de redes sociais, parece-nos urgente dotar o nosso país de um instrumento jurídico específico, embora seja uma matéria em discussão em vários países, e de diversos ângulos, desde a protecção de dados pessoais e liberdade de expressão e de informação”, comenta ao Expresso das Ilhas.
“Quer mediante a actualização do regime jurídico geral de protecção de dados pessoais das pessoas singulares, quer através da adopção de um quadro regulatório específico dos serviços de redes sociais, haverá, certamente, maior capacidade de resposta face às violações de tratamento de dados pessoais”, acrescenta.
Texto originalmente publicado na edição impressa do Expresso das Ilhas nº 976 de 12 de Agosto de 2020
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